terça-feira, 9 de novembro de 2010

Os deputados vão às aulas



Um dia, Manuela Ferreira Leite disse numa conferência de imprensa que, se calhar, o que fazia falta era seis meses sem democracia para pôr tudo na ordem e depois então voltar ao normal. Na semana passada, no Parlamento, Manuela Ferreira Leite “tentou” ensinar o deputado do PCP Honório Novo a educar os seus filhos. Não é grande novidade que Ferreira Leite não é muito admirada nas fileiras comunistas mas, depois destas duas intervenções, penso que cada vez será menos.
Ainda que eu concorde plenamente com a ex-líder do PSD quanto à primeira questão, já não é algo que mereça muito a pena ser comentado, em virtude da altura longínqua em que aconteceu. Porém, a frase que na semana passada disse no Parlamento parece-me muito pertinente, não propriamente pela mensagem pessoal ao deputado comunista, mas sim pelo seu conteúdo mais genérico e aplicável a toda a sociedade e, especialmente, à economia.
Nós já sabemos que as palavras “economista” e “comunista” são de difícil conjugação na mesma frase. Ainda assim, há princípios elementares que qualquer um percebe sem ser economista e um deles foi enunciado por Manuela Ferreira Leite da forma mais simples possível: quem tem o dinheiro é que manda. Ainda que a extrema-esquerda viva na ilusão de que a igualdade absoluta é a melhor forma de vida para uma nação (cada um lá saberá por que o defende…), temos que perceber que isso não é a realidade.
Mas Ferreira Leite não pôs o dedo na ferida só por ter dado uma lição de “Introdução à Economia I” a Honório Novo. Além disso, a deputada social-democrata fez também, com esta afirmação, uma grande chamada de atenção ao Governo de Sócrates. Claro que Sócrates já sabia isto, porque até é engenheiro, mas é sempre bom relembrar, principalmente, todos os portugueses, do motivo pelo qual o PSD se absteve na votação do Orçamento do Estado. Ao contrário do que a pequena oposição fez crer em vários debates na última semana, a viabilização do orçamento foi tudo menos uma concordância com o Governo. Muito pelo contrário, todos aqueles que têm um mínimo de atenção à actualidade sabem que o PSD não podia estar em maior desacordo. Porém, como Manuela Ferreira Leite explicou, era fundamental que houvesse um orçamento aprovado, para agradar aos que têm o dinheiro.
Na aula seguinte, de “Iniciação à Estratégia Política”, Ferreira Leite ensinou ao deputado socialista Afonso Candal o motivo pelo qual é necessário manter uma postura pacífica nas relações PSD-Governo. Ficou a saber o deputado, e todos os que ainda não tinham percebido, que internacionalmente era muito importante Portugal mostrar que não estava na iminência de uma crise política. Por isso mesmo, Ferreira Leite ainda foi mais longe e disse mesmo que não basta deixar passar o orçamento. Para ela, é também preciso que, de facto, PS e PSD se “façam de amigos”, para alemão ver.
Já longe da liderança do PSD e mais afastada da ribalta política, Ferreira Leite apareceu na semana passada no Parlamento para, mais uma vez, dar uma lição de política e economia aos deputados e a todos os portugueses. Agora, já não serve de nada chorar sobre o leite derramado. Mas, como já muitos começam a ver, se tivéssemos dado ouvidos a esta senhora quando previu o que estava para vir, talvez pudéssemos ter evitado muita coisa.




João M. Vargas
(Autor convidado)

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